Rescisão de contratos: conheça o novo entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Desde o advento do Código Civil de 2002, o legislador optou por dar mais ênfase legislativa à probidade e à boa-fé na celebração, consecução e rescisão dos contratos.

Corolário desta opção legislativa foi a de consignar, no parágrafo único do Art. 421 do Código Civil, por meio da Lei Federal nº. 13.874/2019, que nas relações contratuais privadas prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.

Não obstante, até agosto deste ano, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendia que para a rescisão unilateral dos contratos, motivado no inadimplemento da parte adversa, era necessária a prévia declaração judicial, ainda que no contrato fosse estabelecida uma cláusula resolutiva expressa.

Consoante Artigo 474 do Código Civil, as cláusulas resolutivas expressas se operam de pleno direito, de forma que, na ocorrência de inadimplemento que acarrete a aplicação de tal cláusula, o contrato encerrar-se-ia imediatamente, independente de ação judicial.

Por outro lado, as cláusulas resolutivas tácitas necessitam de interpelação judicial.

Antigo entendimento do Superior Tribunal de Justiça

Não obstante, por muito tempo, o STJ olvidando a distinção legal quanto à cláusula resolutiva expressa e a tácita, inobservando, ainda, o princípio contratual da boa-fé, da intervenção mínima e da excepcionalidade da revisão contratual, firmou sua jurisprudência no sentido de que, mesmo havendo no contrato cláusula resolutiva expressa, deveria o judiciário se manifestar para que fosse consumada a resolução do contrato.

Em um dos julgados do Superior Tribunal de Justiça, o Ministro Luiz Felipe Salomão esclarece que:

“De todo modo, ainda que fosse possível superar o óbice verificado, convém ressaltar que a jurisprudência do STJ entende que é imprescindível a prévia manifestação judicial na hipótese de rescisão de compromisso de compra e venda de imóvel para que seja consumada a resolução do contrato, ainda que existente cláusula resolutória expressa, diante da necessidade de observância do princípio da boa-fé objetiva a nortear os contratos”. (AgInt no AREsp 1278577/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 18/09/2018, DJe 21/09/2018)

Neste aspecto, o STJ entendia que ainda que no contrato de compra e venda firmado entre as partes possuísse a cláusula resolutiva expressa, seria necessária a manifestação judicial para que fosse consumada a resolução do contrato.

Novo entendimento do STJ – Observância da legislação e consagração do princípio da autonomia privada

Em agosto deste ano, o STJ alterou drasticamente o seu entendimento, por meio do julgamento do REsp nº. 1.789.863, consagrando o princípio da legalidade, da autonomia privada e da não intervenção do Estado nas relações negociais, homenageando, de forma certeira, a boa-fé que deve reger as relações contratuais.

No caso mencionado, as partes firmaram contrato de compra e venda de um imóvel onde se situava uma fazenda, cujo valor seria pago em sete parcelas. Não obstante, a posse seria transmitida logo após o pagamento da primeira parcela. Infelizmente, após tal ocorrência, o comprador tornou-se inadimplente quanto ao pagamento das demais parcelas.

A vendedora notificou extrajudicialmente o comprador, mas este manteve o inadimplemento, ensejando a aplicação da cláusula resolutiva expressa, o que acarretou a resolução do contrato. Como o comprador se recusou a restituir a posse do imóvel ao vendedor, a vendedora teve de ajuizar uma ação de reintegração de posse.

Neste aspecto, os ministros entenderam que no caso de contratos que possuem cláusula resolutiva expressa, não há necessidade de ajuizamento de ação para que seja declarada a resolução do contrato, de modo que, ante o inadimplemento do comprador, devidamente constituído em mora, operou-se a rescisão da avença e tornou-se legítimo o interesse do vendedor em ser reintegrado na posse do imóvel.

Portanto, ao alterar o seu entendimento, o STJ homenageou o princípio da legalidade, bem como a autonomia privada e a não intervenção do Estado nas relações negociais, vez que a parte lesada não pode possuir o ônus de ajuizar demanda judicial, com o fito de rescindir o contrato, quando na avença firmada entre as partes já existe cláusula resolutiva ao seu favor, privilegiando, pois, a boa-fé que deve reger as relações contratuais.

Por Julia Cristina Princisval Costa (OAB/ES 26.999), advogada do Motta Leal & Advogados Associados

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